DIREITO SISTÊMICO E O EXERCÍCIO DA ADVOCACIA

Por Eunice Schlieck

O Direito Sistêmico, sob uma nova perspectiva, tem origem no Brasil em 2016, ao ser idealizado pelo magistrado Sami Storch, juntamente com a Hellinger Schule, o primeiro curso básico e de pós-graduação em Direito Sistêmico do mundo. Portanto, trata-se de um conhecimento em construção. Consequentemente, nasce assim, através da filosofia hellingeriana, uma nova possibilidade para os operadores do Direito, especialmente para os advogados, ampliando a sua atuação diante dos mais diversos tipos de conflito e chancelando a importância do seu papel como agente pacificador. Corroborando com um novo modelo de advocacia, menos centrada no interesse unilateral e mais focada no bem comum.

Segundo a filosofia hellingeriana, há três leis da vida que regem atitudes e comportamentos de modo geral, quais sejam: o Pertencimento (todos pertencemos a grupos, sendo o primeiro e fundamental o grupo da família), a Hierarquia ou Ordem/Precedência (deve-se respeito a quem chegou primeiro em toda e qualquer ordem de relação), e o Equilíbrio (para a manutenção da harmonia das relações é necessário encontrar o ponto de equilíbrio entre o dar e o receber).

Considerando que o Direito está a serviço das relações humanas, uma vez que estabelece limites e desenha condutas que servem de padrão para o bem comum,  a compreensão das leis da vida e dos efeitos que decorrem a partir do seu rompimento, é ferramenta poderosa para a condução dos conflitos ao melhor termo. O exercício da advocacia alcança um universo de possibilidades ao inserir o conhecimento da filosofia hellingeriana em sua prática. Ao adotar a postura sistêmica surge para o operador do Direito o desafio do não julgamento, que permite vislumbrar o todo e culmina com um trabalho diferenciado, propiciando assim uma maior efetividade na resolução dos conflitos. O que vai ao encontro do anseio social já previsto nas alterações da legislação, como as recentes mudanças efetivadas no Código de Processo Civil de 2015.

Com efeito, a partir da postura sistêmica, o profissional da advocacia dispõe de um manancial de recursos que possibilitam: a) ampliar a sua compreensão da questão em pauta; b) fazer o cliente entender e compreender a base do seu conflito. Observa-se, muitas vezes,  que o cliente profundamente emaranhado em dores emocionais, não raro, não tem condições de reconhecer a própria postura bélica. Então, através de uma condução sistêmica, o advogado tem condições de auxiliar o cliente no sentido de ampliar a visão do contexto. Objetiva-se aqui desenvolver a percepção em relação à outra parte envolvida. Este simples exercício de empatia, traz conforto ao demandante e, com certa frequência promove uma solução mais pacífica para os casos em discussão. Ademais, não apenas na origem do processo, mas ainda que exista uma ação judicial em trâmite, é possível adotar e estimular a postura sistêmica visando dirimir conflitos.

O que se busca, a partir do Direito Sistêmico, é formatar um novo paradigma, com a compreensão de que todos estão interligados também no universo do Judiciário, que faz parte de um sistema próprio, e que pequenas ações impactam na vida coletiva e contribuem para a construção de grandes mudanças.

A Justiça é muito mais que uma mera aplicadora da Lei. É uma importante protagonista da cultura de paz, esta não mais vista como ausência de conflitos, mas como um processo positivo, dinâmico e participativo que favorece o diálogo e a regulação dos conflitos num espírito de compreensão e de cooperação mútuas.

Para que a Justiça promova eficientemente a cultura de paz e seja uma catalisadora para a mudança das relações sociais, ela pode e deve valer-se de outros saberes, como a importante filosofia hellingeriana, que vem sendo tão disseminada pelo mundo afora, e o pensamento sistêmico que vem transformando essas relações.

Em suma, o Direito Sistêmico pode ser percebido como uma releitura do conflito, a partir da compreensão da filosofia hellingeriana e do pensamento sistêmico, que possibilita ao operador do Direito um alcance do que está além do aparente e, ainda, resgatar a dignidade e a autonomia de vontade do indivíduo, princípios constitucionalmente garantidos.

Por fim, o Direito Sistêmico, sob uma nova ótica, surge num momento em que todos os sistemas enfrentam a ameaça de colapso, inclusive o próprio Judiciário, e como alternativa aponta caminhos para o exercício de uma nova justiça mais atenta as necessidades de todos os cidadãos.

Eunice Schlieck

Advogada. Presidente da Comissão de Direito Sistêmico da OAB/SC. Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Sistêmico. Pós graduanda em Direito Sistêmico, turma de 2016, Faculdade Innovare/SP.

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